Por Carolina Mouta
Matéria publicada no site Bolsa de Bebê
Imagem: Dreamstime
Os andadores infantis são
sempre motivo de muita polêmica entre pais, médicos e fisioterapeutas. A
maioria dos pais - mais as mamães - apoia a utilização do equipamento que, de
boca em boca, vai ganhando mais adeptos. Médicos e fisioterapeutas só veem
aspectos negativos no uso desse trem: é um perigo para a coordenação motora e
um prato cheio para acidentes. Em alguns países, como o Canadá, a comercialização
do andador é proibida.
Turma
do contra
Sem qualquer sombra de
dúvidas, entre os pediatras, há um consenso: o andador só atrapalha. Para
começar, ele aumenta significativamente o risco de quedas, o que pode provocar
graves danos aos pequenos. Segundo Aramis Antonio Lopes Neto, presidente do
Departamento Científico de Segurança da Criança e do Adolescente da Sociedade Brasileira de Pediatria (SBP), não há números confiáveis sobre os acidentes
causados pelo equipamento. No entanto, a vivência dos médicos diz muito sobre o
assunto. "Os pediatras que trabalham em serviços de emergência sabem que
tal fato não tão raro", alerta.
A Academia Americana de
Pediatria aponta que 30% das crianças que usam o andador sofrem sérios
acidentes (incluindo queimaduras, intoxicações e afogamentos). Desses
acidentes, 80% são quedas de escadas e um terço das crianças sofrem
traumatismos graves, que necessitam de internação. A SBP estima que o
acessório, apesar das recomendações dos médicos, ainda faz parte da lista de
compras de cerca de 60 a 90% dos pais de bebês entre seis e 15 meses de idade.
Para piorar, estudos mostram que 70% das crianças que sofreram traumatismos com
andadores estavam sob supervisão de um adulto.
Isso acontece porque, ao
colocar a criança no andador, os pais tendem a relaxar. "Muitas vezes o
andador é usado para a mãe descansar, o que é uma falsa ideia, já que a criança
fica tão sujeita a quedas e acidentes como uma criança sem andador. Criança no
andador chega mais longe com maior velocidade e, portanto, precisa de mais
supervisão", ressalta a fisioterapeuta Angela Rios. Ou seja, grande parte
dos acidentes pode acontecer por pura negligência dos pais.
Além do risco de acidentes,
para os especialistas, o acessório tem outro porém: faz com que o bebê deixe de
passar por momentos importantes de sua maturação neurológica, prejudicando o
desenvolvimento do equilíbrio, da coordenação motora fina, da marcha e por aí
vai... E os danos são inúmeros. "Além dos prejuízos de aprendizado por não
ter liberdade para buscar, tocar e levar à boca os objetos, há menos estímulo
para a curiosidade e criatividade. A criança pode pular a etapa de engatinhar,
que é importante para a formação do osso do quadril e das curvaturas da
coluna", explica Angela.
Se não engatinhar já
prejudica esses ossos, imagine quando a criança pula essa etapa e ainda é
colocada em um andador... "A criança sentada com as pernas abertas pode
ter uma alteração na formação do osso do quadril e das pernas, e como o assento
tem apoio nas costas, a criança não trabalha a força dos músculos próximos à
coluna e abdominais, gerando risco maior de curvaturas anormais, como a
escoliose", garante a especialista.
E não é só isso. Se a
criança for muito pequena e usar o andador nas pontas dos pés pode adquirir um
padrão errado de marcha e atrapalhar o desenvolvimento das curvas e dos
músculos dos pés. "Há também o prejuízo de não desenvolver a força das
pernas e braços para as trocas de posturas. Por ter um menor gasto energético,
a criança que passa muito tempo no andador pode desenvolver obesidade muito
precocemente", alerta Angela.
Engatinhar é importante e,
por mais que os pais estejam ansiosos para ver o pequeno andando, é preciso ter
calma. Cada coisa no seu tempo. "As etapas de desenvolvimento natural das
crianças devem ser possibilitadas e valorizadas", orienta o Dr. Aramis. Os
pais não têm noção do quanto isso é importante. Um atraso motor, por exemplo,
poderá acarretar dificuldades na aquisição da fala. Isso acontece novamente por
causa da falha no desenvolvimento neurológico que se resume no trio
andar-falar-pensar.
A
favor
Apesar de toda abominação
dos médicos não é difícil encontrar mamães com experiências positivas em
relação ao uso do andador. Elas fazem parte da galera a favor do equipamento. O
principal motivo é dar uma opção de entretenimento ao bebê enquanto elas ficam
na lida diária. "Eu sempre disse que nunca iria dar um andador para os
meus filhos. Entretanto, essa foi a única forma que achei para dar conta dos
afazeres domésticos. Logicamente, eu nunca abandonei as crianças à mercê do
andador. Nunca aconteceu nenhum acidente e não notei nenhum tipo de prejuízo no
desenvolvimento deles", assegura Verônica Arquimedes, mãe dos gêmeos
Larissa e Breno, de um ano.
Todos os riscos de acidentes
e retardos no desenvolvimento parecem não convencer essas mamães que tentam
minimizar os possíveis estragos com o uso calculado do equipamento. "Sou a
favor do andador, mas com moderação. Se o bebê estiver sob o olhar atento da
mãe, que mal faz? O que não dá é para prender a criança e deixá-la assim o dia
todo. No entanto, uma horinha por dia não há de prejudicar", analisa Elisa
Chaves, mãe de Victor, de nove meses. Vanessa Costa, grávida de sete meses de
Vivian, concorda com o meio termo. "Acredito que deva haver bom senso. Não
adianta querer usar para que a mãe se beneficie. Quem tem que se beneficiar é a
criança. Colocar o bebê na época certa, sob supervisão, com o tempo controlado,
eu acho super válido. Com certeza o andador está na minha lista e vou comprá-lo",
diz.
Tem gente que além de só ver
benefícios, repete a dose e ainda recomenda. É o caso de Catarina Silveira, mãe
de Bruno, de seis anos e à espera de Rafaela. "Meu primeiro filho começou
a usar com oito meses e foi ótimo. Já estava engatinhando e, sinceramente, acho
que não pulou nenhuma fase. Pouco antes de completar um ano já estava andando.
Com certeza vou usar novamente com meu segundo bebê", planeja. Cibele
Sanz, mãe de Bernardo, de dois anos garante que as quedas passaram longe de seu
filho. "O Bernardo usou andador e eu recomendo. O primeiro tombo dele foi
sem o andador. É só colocar o equipamento num lugar plano e ficar de
olho", opina.
Mariana Cunha, arqueóloga,
mãe de Isabela, de cinco meses, é bem mais polêmica. "Eu cheguei à conclusão
de que, para os médicos, tudo é errado: dar mamadeira, chupeta, alimentos
industrializados. No entanto, nós, mães, somos a detentora da palavra final.
Nós conhecemos o nosso bebê e sabemos suas necessidades", esbraveja.
Nem
aliado, nem inimigo
Na verdade, o assunto é
controverso mesmo. Uma recente pesquisa feita por Paula Silva Carvalho Chagas,
professora da Faculdade de Fisioterapia da Universidade Federal de Juiz de Fora
(UFJF), mostrou que não existem dados que comprovem prejuízos ao
desenvolvimento dos bebês por causa do equipamento, bem como não há evidências
sobre benefícios às crianças.
No estudo - feito com dois
grupos, um com andador e outro sem - foram observadas a maneira de andar das
crianças, a habilidade em subir rampas e o relato dos pais. O resultado é que
não houve diferenças no processo entre eles. Todos os bebês apresentaram
desenvolvimento normal, aprendendo os movimentos corretamente, em um tempo
adequado.
Segundo a pesquisadora,
alguns mitos foram desfeitos com os resultados: as crianças não andavam na
ponta dos pés, com pernas mais ou menos abertas, não se jogavam para frente ao
caminhar e nenhuma das crianças andou mais cedo ou mais tarde por conta do uso
do andador. Para a fisioterapeuta, os resultados poderão contribuir para que a decisão
clínica de optar pelo uso do andador ou não seja feita com base em dados
científicos.
Diferentes
modelos
Por causa de tanta polêmica,
o mercado apresentou um novo modelo de andador: o vertical. Mas, pra a SBP, não
há distinção entre andadores circulares e verticais. Apesar da ideia de que a
criança terá mais liberdade, os pais devem ficar atentos ao que pode vir junto
a isso. "O andador permite uma mobilidade maior da criança e lhe dá
velocidade para locomover-se, mas também reduz significativamente o seu
controle de direção e a sua capacidade de parar ou de desviar de possíveis
obstáculos", analisa o Dr. Aramis.
Vamos entender a diferença
entre os modelos. O andador circular é aquele em que a criança fica dentro de
um "disquinho", sentada em um apoio, geralmente de tecido.
"Enquanto fisioterapeuta e mãe, digo que os esses andadores são
potencialmente prejudiciais para o desenvolvimento dos bebês e deveriam ser
proibidos. Muitas vezes são considerados bens de consumo e familiares
presenteiam o bebê com um por acharem facilitador para quem cuida da
criança", diz Angela Rios, que exemplifica o mal que o equipamento faz:
"Ao visualizar um objeto que desperte a curiosidade, a criança livre se
arrasta, engatinha ou anda até ele e pode tocá-lo, pegá-lo, colocá-lo na boca.
A criança presa no andador pode até chegar mais rápido no objeto, mas não
conseguirá pegá-lo, e isso inibirá sua curiosidade para buscar objetos de
interesse. O desenvolvimento da criança se dá principalmente pela curiosidade e
pelo estímulo dos sentidos - visão, audição, tato, paladar, olfato", diz.
Esse modelo permite uma
marcha sem direção, o que, segundo Angela, não é normal. "A criança deve
primeiro aprender a andar pra frente, com os pés apoiados inteiramente no chão.
Isso favorece o desenvolvimento dos músculos dos pés e das pernas e influencia
diretamente a formação das curvaturas da coluna. No andador circular o bebê
anda "sentado" que é completamente diferente da marcha normal. Além
disso, não tem mobilidade para buscar objetos no chão, fica restrito apenas ao
que lhe é dado e colocado na mesinha do andador. Com isso, a criança não
desenvolve o equilíbrio para trocas de postura (sentado - ajoelhado - em
pé)", observa a fisioterapeuta.
Além de problemas de marcha,
ósseo e muscular, a criança também pode ter atraso na sua percepção de espaço.
"Uma criança livre aprende a se movimentar passando por espaços estreitos
(atrás do sofá, embaixo da cadeira) e amplos (salas, quintais e corredores).
Assim, ela percebe o lugar que ocupa nesses espaços. Presa no andador, é
evidente que sua noção de espaço fica limitada", esclarece.
O andador vertical permite
mais liberdade, mas é importante que a criança esteja sempre sob a supervisão
de um responsável e tenha liberdade para usar o andador ou movimentar-se sem
ele, usando outros objetos ou paredes como apoio. Para quem ainda não conhece,
o andador vertical é aquele que serve como auxílio para a criança se levantar e
empurrar. Pode ser usado depois que a criança já passou pelas etapas de
arrastar e engatinhar, geralmente quando ela começa a subir nos objetos e,
espontaneamente, tenta andar pra frente. "Ele é mais indicado para o
desenvolvimento da marcha, pois não interfere na direção e permite que a
criança desenvolva o controle de levantar, apoiar e voltar para o chão, quando
ele quiser", orienta Angela. A criança fica completamente livre para
abaixar e pegar um brinquedo, por exemplo. Alguns especialistas já olham essa
opção com outros olhos.
Mas, apesar de mais aceito
por alguns profissionais, o andador vertical é tão dispensável quanto o
circular. Na visão dos especialistas, o uso do andador é completamente
desnecessário. A criança precisa experimentar seu corpo livremente, treinar
mudanças posturais, e os tombinhos são essenciais para ao auto aprendizado do
esquema corporal, da noção espacial e do equilíbrio. É preciso ter paciência.
"A aquisição das habilidades são naturais e progressivas e variam de
acordo com a aptidão de cada criança. Não existem mecanismos ou técnicas para
abreviarem o tempo ou para suprimirem etapas do desenvolvimento de uma
criança", ressalta o Dr. Aramis.
A fisioterapeuta Angela Rios
endossa o coro. "Não vejo em que situação o uso do andador circular seja
fundamental, e em minha opinião não deve ser utilizado em nenhuma idade. É
interessante que, caso a criança não tenha a disposição um andador, ela vai
usar qualquer objeto que lhe permita apoiar, como uma cadeira", explica.
Como estimular sem andador
Para que seu bebê se sinta
incentivado a dar os primeiros passinhos, quanto menos coisas pelo meio do
caminho, melhor. "Organize o espaço, permitindo a movimentação autônoma,
livre e segura da criança, sempre supervisionada por um cuidador atento",
diz o médico. Por isso, assim que o bebê
senta, o melhor estímulo é deixá-lo à vontade, no chão, para explorar o
ambiente. Assim, ele irá engatinhar, levantar, se apoiar no sofá e, quando você
menos esperar, estará correndo pela casa!
De acordo com a
fisioterapeuta Angela Rios, o andador pode ser substituído por adaptações na
casa. "O andador não é a solução para a criança ficar menos tempo no colo,
pois sua curiosidade para ir para o chão depende de estímulo e paciência.
Sugiro que a mãe procure adaptar a casa para que a criança movimente-se
livremente com o menor risco possível", aconselha. Então, que tal algumas
dicas da especialista?
- Coloque protetores nas
tomadas, não deixe objetos eletrônicos ao alcance da criança;
- Retire objetos de vidro e
quebráveis da altura de acesso da criança, e substitua por brinquedos para que
ela se interesse pelo ambiente;
- Procure manter o chão
sempre limpo;
- NÃO deixe a criança de
meia no chão liso, pois assim ela pode ter dificuldade para se arrastar e não
se interessar pelo ambiente.
- Lembre-se que pequenas
quedas e leves ferimentos são próprios da infância e não justificam uma
superproteção, o que torna a criança ainda mais vulnerável.
Viu só? Para os
especialistas a receita é simples: para estimular os pequenos nessa nova fase
ofereça a firmeza do chão e a sua fiel companhia! O que você acha?